Familiares de vítimas e Flamengo não entram em acordo por indenização após reunião
Famílias buscarão agora na Justiça por indenização. "Eu me sinto abandonada pelo Flamengo. A decepção foi muito grande" diz mãe do jogador Arthur Vinícius, ao fim de reunião.
Familiares dos 10 jogadores e 3 feridos do incêndio no Ninho do Urubu se reuniram com Flamengo na tarde desta quinta-feira (21), na sede do Tribunal de Justiça. A intenção era novamente tentar chegar a um acordo sobre a indenização que o Clube terá que pagar as famílias mas isso não aconteceu, as negociações estão encerradas. Os valores oferecidos pelo Flamengo não agradaram as e o próximo passo é buscar na justiça pela indenização, o que pode levar muito tempo.
Ministério Público revelou que valores da proposta do Flamengo ficavam em torno de R$ 300 a R$ 400 mil e no máximo 10 anos um salário mínimo (atualmente de R$ 998,00) por mês até 45 anos. A proposta da câmara era de R$ 2 milhões e R$ 10 mil mensais até 45 anos. Tratando de forma diferente as vítimas fatais, hospitalizadas com sequelas, as que não vão ter mais sequelas, aquelas que sofreram meramente danos morais. E que os outros valores eram menores, não havendo discordância em relação aos grupos, mas aos valores.
MP e a defensoria pública já haviam entrado com uma ação contra o Flamengo no fim da tarde da última quarta-feira, pedindo o bloqueio de 57 milhões dos bens do clube que seriam destinados ao pagamento das indenizações, além do fechamento do Ninho do Urubu. O Juiz Bruno Monteiro Ruliere, do juizado Especial do torcedor e Grandes Eventos, deu cinco dias para o Clube se defender do pedido de urgência de interdição do CT e bloqueio de milhões.
Os familiares e representantes das vítimas deixaram a reunião revoltados e deram algumas declarações a imprensa na saída. O pai do goleiro Bernardo Pisetta, vítima que morreu na tragédia -, disse que o Flamengo apresentou valores pífios, questionou a ausência do presidente Rodolfo Landim e afirmou que as negociações estão encerradas.
– Não houve mediação. A gente pediu para que o Flamengo fizesse uma proposta e vieram com valores pífios. Valores que não satisfizeram as familiares. Não há ninguém do Flamengo aqui que decida. Onde está presidente? Será que ele tinha algo mais importante para fazer? É uma falta de respeito. Peço a todos os torcedores que vão estádio e que tem mandado mensagens para nós que reflitam o que o time que eles torcem está fazendo com a gente. Isso não se faz nem com cachorro. Não houve negociação. Qualquer tipo de negociação está encerrada – disse Danrlei Pisetta, pai do goleiro Bernardo.
– Atitude do Flamengo é uma falta de respeito com a gente, os pais. Foi passado que estão dando apoio, nenhum…Eles estão brincando com a vida dos nossos filhos, queria saber se não são pais, pelo que estão fazendo com a gente, a tortura que o Flamengo está fazendo conosco. Não definiu nada, estamos aqui como bobos, palhaços. Fomos desamparados por todos, não nos sentimos acolhidos por ninguém, principalmente pelo Flamengo. Eles não têm resposta para nós, familiares. Não foi falado nada – lamentou Cristiano, pai do goleiro Christian, uma das dez vítimas fatais no incêndio no Ninho do Urubu.
– A decepção é muito grande. Os nossos filhos morreram juntos, então devemos lutar juntos. O que estão fazendo com a gente… Não tem preço, não vão trazer nossos filhos de volta, mas a gente queria dignidade. Quantos pais lá falaram que o filho chorou no dia das mães porque estava longe, todo final de semana eu estava com o meu. Eu penso assim, tinha que ter um pouco de respeito. Respeito por nós, pai. Está faltando.Ele (presidente Rodolfo Landim) mandou o vice-presidente (Rodrigo Dunshee). Ele (Dunshee) simplesmente saiu e abandonou a reunião, nenhuma satisfação. E se fosse a gente que não desse satisfação? E se o filho não voltasse para treinar, a gente não tinha que dar uma satisfação? Essa satisfação a gente não tem. Tudo que foi proposto foi por água abaixo – disse Marília, mãe de Arthur.
As famílias pedem o mesmo valor proposto pelo Ministério Público. A advogada Paula Wolff, uma das representantes das vítimas frisou que as famílias estão pedindo 15% do orçamento anual do Flamengo, com previsão total de R$ 750 milhões em receitas em 2019. A decisão de encerramento das negociações anunciado pelos familiares é o oposto da declaração dada pelo medidor do caso, o desembargador César Cury. Ao deixar o encontro ele afirmou acreditar que as partes entraram em acordo dentro de no máximo dois meses.
Confira a nota publicada pelo Ministério Público
“A Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro informa que representou as famílias de quatro dos 10 jovens mortos no incêndio ocorrido no Ninho do Urubu, durante a audiência de mediação com o Clube de Regatas do Flamengo, realizada na tarde desta quinta-feira (21), no Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ).
Assim como os familiares das demais vítimas, as pessoas representadas pela DPRJ estavam dispostas ao diálogo. Contudo, a proposta de indenização apresentada pelo Flamengo foi novamente considerada aquém do minimamente razoável diante da enorme perda dos envolvidos. Por decisão de todas as famílias, as tratativas para a mediação foram encerradas ao fim da tarde desta quinta.
A Defensoria Pública informa que segue à disposição das famílias para orientá-las sobre as medidas judiciais possíveis. Além disso, aguarda a decisão quanto ao pedido de bloqueio de R$ 57,5 milhões das contas do Clube de Regatas do Flamengo e a imediata interdição do Ninho do Urubu, requeridos em medida cautelar protocolada em conjunto com o Ministério Público do Estado, nessa quarta-feira (20), no Juizado Adjunto do Torcedor e dos Grandes Eventos.
Rio de Janeiro, 21 de fevereiro de 2019″
Confira, na íntegra, a decisão que da cinco dias ao Flamengo para se defender de ação do Ministério Público e Defensoria Pública:
“Trata-se de demanda proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO e a DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO em face do CLUBE DE REGATAS DO FLAMENGO, visando tutela provisória de urgência, de natureza cautelar, em caráter antecedente. Petição inicial de fls. 02/26, instruída com documentos de fls. 27/108.
Os demandantes afirmam que, no dia 08 de fevereiro de 2019, no interior do Centro de Treinamento George Helal (popularmente conhecido como ´Ninho do Urubu´), ocorreu um incêndio em contêiner instalado no local e utilizado como dormitório de adolescentes, atletas da categoria de base do Clube de Regatas do Flamengo.
O incêndio acarretou a morte de dez jovens e lesões de diversas naturezas a outras vítimas. Defendem que elementos de informação noticiam a existência de irregularidades no Centro de Treinamento George Helal. Informam que restaram frustradas as tentativas de celebração de um termo de ajustamento de conduta com o réu visando a reparação dos danos individuais e coletivos decorrentes do fato. Noticiam que a presente medida de caráter antecedente visa resguardar o resultado útil de futura demanda objetivando reparar os danos materiais e morais, individuais e coletivos, bem como tutelar a segurança e a integridade de atletas, funcionários e torcedores que frequentam o Centro de Treinamento George Helal.
Diante disso, formulam requerimento de tutela provisória consistente em:
(1) a interdição de todo o Centro de Treinamento George Helal (popularmente conhecido como ´Ninho do Urubu´), até que as referidas instalações do complexo esportivo do Clube de Regatas do flamengo estejam completamente seguras e regularizadas junto ao Corpo de Bombeiros e ao Município do Rio de Janeiro, com a emissão de certificado de Corpo de Bombeiros, alvará de funcionamento e habite-se;
(2) o arresto no valor de R$ 57.550,000,00 (cinquenta e sete milhões e quinhentos e cinquenta mil reais), com o fim específico de ressarcimento das indenizações de caráter individual e coletivo a serem posteriormente apuradas;
(3) a exibição dos seguintes documentos:
a- todos os contratos assinados entre o Clube de Regatas do Flamengo e seus jogadores profissionais e da base, dos últimos 2 anos, com o objetivo de apurar a média salarial, tantos dos jogadores profissionais (perda de uma chance), quanto dos jogadores da base (prejuízo material atual ou iminente);
b- documentos relativos à escala de monitores em atividade junto aos atletas da base no CT George Helal ao longo dos últimos 2 anos, com o objetivo de apurar o cumprimento do número mínimo de profissionais para atendimento de grupos de 10 jovens atletas alojados em suas instalações, no período diurno e noturno;
c- os projetos de construção submetidos pelo Clube de Regatas do Flamengo à Secretaria Municipal de Urbanismo nos anos de 2010 e de 2018, com o objetivo de apurar que a construção do alojamento dos jovens atletas da base do Flamengo era irregular e clandestina, não constando dos projetos submetidos aos órgão públicos da administração pública municipal para fins de regularização urbanística;
d- documentos necessários para o efetivo funcionamento do Centro de Treinamento George Helal, em especial, Certificado Definitivo do Corpo de Bombeiros dos Estado do Rio de Janeiro, Alvará de Funcionamento emitido pela Secretaria Municipal de Fazenda e Certificado de Habite-se emitido pela Secretaria Municipal de Urbanismo, com o objetivo de apurar que as instalações desportivas do Clube de Regatas do Flamengo permanecem em situação ilegal, irregular e insegura.
O réu compareceu espontaneamente aos autos, às fls. 109/110, requerendo que seja oportunizado o contraditório prévio à análise dos requerimentos de tutela provisória.
É O QUE CABIA RELATAR. DECIDO.
Considerando o disposto no artigo 306 e artigo 398, ambos do Código de Processo Civil, aguarde-se o oferecimento de defesa, no prazo de 05 (cinco) dias, observada a regra do artigo 239, §1º do mesmo Diploma.
Decorrido o prazo, abra-se conclusão.
Rio de Janeiro, 21 de fevereiro de 2019.
BRUNO MONTEIRO RULIÈRE
JUIZ DE DIREITO”
*Declarações retiradas do Globo Esporte